Mãe de um numerário escreve a roberto cabrini, do jornal da noite

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Prezado Cabrini,

Parabéns por ser o pioneiro em começar a levantar o "véu" que cobre essa seita, que - não sei como - tem a petulância e arrogância de se chamar Obra de Deus. O incontável número de famílias sofredoras, atingidas por ela desde sua infeliz fundação, só agora está se dando conta que quando um ente querido foi "surrupiado de seu lar, a atitude certa é falar com todo mundo, comentar, se informar a respeito e tentar contactar outros companheiros de sofrimento (o que é muito difícil, já que ninguém sabe quem é da Obra...). Entretanto, tanto a família que teve seu filho(a) "seqüestrado" do seio de um lar normal, cristão e feliz, assim como os membros da Obra que conseguiram dela sair, tinham vergonha de relatar os fatos, achando que seu caso era um problema particular, era único ... e insolúvel.

Nossa história é igual a de todos que foram enganados por esta seita. Nosso filho (já está lá há 5 anos: foi tirado de casa, do emprego, da cidade, do Estado, por motivos óbvios, claro). Tentei de tudo para me aproximar da Obra, tentar entender o que meu filho viu lá que era tããããão melhor que nosso lar, nossa família (sempre alegre)... Fui falar com o "Diretor Espiritual" do Guto (aliás, na conta dele o Guto depositava todo seu salário, que não era pouco, pois, formado pela GV, falando 4 línguas, e ótimo profissional... ). Ofereci para organizar palestras para eles - gostam muito disso lá - ou quaisquer outras coisas QUE NÃO FOSSE LIMPAR, LAVAR, COZINHAR, coisas, que aliás foi exatamente o que o Diretor do Centro me sugeriu, com essas exatas palavras : "fazer um trabalho com as moças da limpeza!!!" Não que tenha algo de mal limpar, lavar, etc... Entretanto, o que ofereci de ajuda, foi na parte cultural (sou tradutora, revisora, professora de inglês, escritora). É lógico que depois desta "simpática oferta", me levantei, fui embora e nosso delicioso mundo familiar começou a desmoronar (temos mais 1 filho e 1 filha, maravilhosos, como ERA o irmão).

Nosso filho praticamente não vem nos ver mais (durante este ano todo só veio nos visitar 2 vezes), porque a Obra não deixa : claro, não falam NÃO com todas as letras : simplesmente o enchem de atividades suficientes para ele (e todos os outros numerários) não tenham tempo nem de fazer xixi, quanto mais de pensar, ou de enfrentar uma viagem - de ônibus, claro - do Rio para SP (sem contar que isto custa $. E o $ que o Guto ganha (bolsa de estudos, pós graduação na Copead) ele repassa totalmente para a Obra, pois precisa ajudar em todos os projetos sociais! ( Pergunto : como o da Pedreira?, para o qual, no passado, ingenuamente contribuimos regiamente, ajudando - sem saber - a "afundar" jovens como o Fagner Barros e tantos outros que nem conhecemos... Ou para a AFESU (a pomposa Associação Feminina de Estudos Universitários (que de Universidade não tem nada), para quem trabalhei 1 ano e meio para arrecadar fundos para "ajudar moças sem recursos a cursarem uma faculdade". Não é o máximo? Pois é! TODAS as moças que frequentam esses cursos, aprendem a limpar, arrumar, cozinhar, servir. As únicas atividadesextras são os cursos deformação (ou formatação???) de religião, de acordo com a Obra. Detalhe interessante : TODAS essas moças, que vêm "estudar na cidade grande"... acabam por ter "vocação" para viver o "espírito da Obra"... e se tornam Numerárias Auxiliares, verdadeiras empregadas-escravas, que têm o direito de visitar a família por 4 dias... POR ANO!!! E sempre acompanhadas por outra numerária. Dá dela querer ficar por lá... (em geral são do interior). Já calculou quanto $ a Obra economiza com essa mão de obra barata??? E sempre com a certeza de ter o melhor serviço possível, pois , afinal... elas fazem o que fazem "por amor a Deus", que "as escolheu" para viver a santidade no meio mundo ... que MUNDO??? o da Opus ???? Vocação, tem-se. Não se produz. E na Obra, a Vocação "aparece divinamente" de fora para dentro : ou seja : desde que você seja "gente de valor", "apitável", começam no centro que você frequenta o "plano inclinado" para te "pescar" o mais rápido possível.

Eu comentei algumas poucas coisas que consegui descobrir a respeito desta maldita organização, para meu filho, antes dele entrar de vez para o Opus Dei. E ele dizia : "você está louca, jamais falarei isto ou aquilo para voce!"... Mas ele falou. Quer um exemplo ? Comentei : "Guto, você um dia vai me dizer que tem outra família. Que eu sou apenas sua mãe biológica." Ele ficou doido da vida, disse que isso era um absurdo, que eu era louca, só inventando coisas para ele não seguir a vocação que tinha, que eu não queria deixar ele fazer o que ele queria, etc, etc. Alguns meses depois, perto do Natal, perguntei a que horas ele viria lá em casa. Resposta : "Dia 24 não vou não. Só dia 25, pois agora você tem que entender que eu tenho outra familia." !!!

Com todas as imposições que são feitas, o rapaz ou a moça acham que estão "optando" por uma maneira cristã de vida. Entretanto, o que ocorre é lavagem cerebral mesmo. Já me falaram que "estou me envenando" com esta história da Opus. Que "o Guto é maior de idade e que sabe o que quer da vida". A bem da verdade, não estou me envenando... tenho sido envenenada pelo Opus Dei. Pela sordidez com que agiram, ocultando as verdades, pois afinal "seus pais não vão entender" frase sempre repetida e martelada lá dentro, motivo pelo qual Guto não contava nada do que se passava lá. Estou sim envenenada - e sofrendo muito - pela falta do nosso filho (não física, que não esteja do meu lado 24 horas por dia ), mas de impedir a felicidade entre nossa família e a de meu filho. Esta pela falta delicada e amorosa que sempre foi. Uma espécie de A.O. e D.O (=> antes da Opus e depois da Opus). Estou amargurada, por ver que a maioria das pessoas aparentemente acha que o meu repúdio pela Obra é a razão não é essa a razão de nossa infelicidade. Ela vai além, muito além de querer ter um filhote sob minhas asas. É a tristeza desoladora dever que estes 5 anos foram apenas o começo de um longo calvário, de nossa parte e da parte de nosso filho. O dia que ele sair desta "oitava maravilha do mundo", e ele - se Deus quiser vai sair um dia!- vai começar uma via crucis para ELE, para se adaptar de novo ao mundo real; quando ele sair da Obra, sem eira nem beira, vai ter que lutar com muita garra para ver de novo o mundo do qual a Prelazia Pessoal o cerceou demaneira ignóbil. Prelazia que se instala nas dioceses à revelia de muitos bispos. Uns gostam, outros não. NENHUM tem o que dizer ou falar, pois o que a Prelazia decidir, é decisão suprema, não importando que vá ou não de encontro ao bispo e/ou diocese. Afinal, a Obra só tem que se reportar ao Papa a cada 5 anos. Se "o Papa (anterior) aprovou" é porque dependeu da Opus para se eleger. Se o atual papa aprova, fecha-se os olhos para "essas pequenas mazelas"... e ele tem mais que fazê-lo, pois afinal 30% das despesas do Vaticano são pagas pelo Opus Dei. Você já entrou no site www.opuslivre.org??? Não? Então entre. Leia alguns dos depoimentos e certifique-se que o que você está fazendo, Cabrini, expor a sordidez escondida na "Obra de Deus" é uma luz, aliás, um farol (dos grandes!) iluminando o fim de um túnel que nós (familiares, amigos, ex-membros) achávamos que não teria saída.

Obrigada pela sua atenção, tempo em ler este (desculpe! tão longo) e-mail e boa vontade. E só mais uma perguntinha : não dá para passar mais alguns trechos do excepcional depoimento da Thelma Pavesi ? O que ela falou pareceu-me um "aperitivo" para uma lauda (e longa) ceia...O que você mostrou nestes 4 programas sobre o Opus Dei é uma pontinha de um iceberg. Provavelmente, um dos maiores que você poderá encontrar na sua carreira.

Um abraço

Betty Silberstein